Por Adriano Mariussi Baumruck.
Mais cedo ou mais tarde a obra de grandes artistas encontram questões universais como o preconceito de cor e raça, a religião, o lugar da mulher na sociedade etc. Abordar tais temas é só questão de tempo e é em uma cabana que abriga oito figuras detestáveis, no meio de uma nevasca, que o diretor Quentin Tarantino encontra o pretexto para expor mazelas presentes não só na sociedade norte-americana, mas em todo o mundo moderno. O preconceito entre brancos e negros, nortistas e sulistas e o fardo carregado por uma mulher prestes a ser enforcada, é o que apimenta esse sangrento e claustrofóbico bang bang do diretor que não tem medo de expor suas influências.
Todos sabemos, e isso não é de hoje, que Tarantino possui uma imensa bagagem cinematográfica de influências. Isso pode ser notado não apenas na fotografia ou na trilha sonora – que em “Os Oito Odiados” merece destaque especial, uma vez que o maestro Ennio Morricone não compunha trilha para Westerns há tempos – , como também no roteiro. Quando falamos de Quentin lembramos principalmente de roteiros que privilegiam duas coisas: a violência plástica e bastante exagerada e os diálogos longos e que parecem não levar nada para lugar nenhum, mas que desvelam muito sobre os personagens. Essas são duas marcas que aparecem vivíssimas em seu oitavo filme. Podemos destacar a atuação irônica e cruel de Samuel L Jackson e a sequência do café.
Porém, como nem tudo são flores, ao analisarmos o antepenúltimo filme do diretor ( Tarantino tem planos de se aposentar quando completar 10 filmes) , vemos que ele começa a repetir fórmulas e fazer autocitações. Muitos dizem que o roteiro do filme se assemelha ao de sua primeira película, o famoso e aclamado “Cães de Aluguel” ( 1992), onde vemos um grupo de bandidos que após um assalto frustrado, reúnem-se em um galpão para tentar encontrar quem era o policial infiltrado. Porém, diferentemente do que acontece com o filme de estreia do diretor, aqui o roteiro não se sustenta, fazendo com que furos surjam tornando uma história que tinha tudo para ser interessante, em um exercício claustrofóbico de paciência. Além disso em determinado momento, o ator Michael Madsen aparece em uma tomada quase que idêntica à de seu mesmo personagem em “Kill Bill” ( 2004).
“Os Oito Odiados” não é um filme ruim nem bom. Digo isso, pois perto da avalanche sem personalidade dos filmes de super-heróis, que amontoam-se em nossos cinemas atualmente, ele se mostra como um filme de arte, seja pelo seu acabamento, pela sua duração, ou pela direção conceituada. Porém, para quem conhece o trabalho do Quentin Tarantino, ele tem gosto daquele mesmo guisado que comíamos quando crianças, mas que tinha sempre o mesmo gosto, independentemente do tipo de carne que colocássemos dentro.
Em suma, Quentin Tarantino continuará sendo um dos diretores mais contundentes dos tempos atuais, mas devemos ter em mente que esse último filme, independente da filmagem com as câmeras Ultra Panavision em 70 mm e a trilha de Morricone, não tem o mesmo fôlego de seus sete antecessores, mas continua sendo muito melhor do que a grande maioria de filmes que temos visto hoje.